Tava lembrando de algumas coisas após ficar pensando sobre o que disse o meu camarada véio de guerra, Ricardo sobre passeatas. Longe de querer mudar o seu jeito de ser, nem a paus, tô pouco me lixando, o cara tem mais é que ser feliz como quiser. Nem quero que ele acorde mais cedo para participar de passeatas cheias de boas intenções, como ele diz, e parar com sua produção. Ele é bem macaco véio, e eu idem pra pensar que alguma fala ou escrita vá mudar algo no seu modo de viver ou no meu.
Eis que lembrei de dois caras muito bons, do Uivo, de Ginsberg, em seu "America", principalmente em algumas passagens, em que menciona sa luta pacifista, libertária, anti-nuclerar e anárquica, crítica ao macarthismo direitista e a socialismo burocrático também. sAssim como Rimbaud, a revolução começava pelo indivíduo, uma transformação radical, onírica, do desejo. Esse é um cara que participava das passeatas, mas dançando como um dioniso, rodopiando e bailando no meio dela, de um modo que sua individualidade não se apagava de modo algum:
"America quando acabaremos com a guerra humana?"
"Vá se foder com sua bomba atômica"
Há coisas lá também autobiográficas, como o fato conhecido de sua mãe ser comunista, Naomi Ginsberg, que é melhor descrito em "Kaddish"
"América eu era comunista quando criança e não me arrependo"
"Você devia ter me visto lendo Marx"
"América quando eu tinha sete anos minha mãe me levou a uma reunião da célula do Partido Comunista eles nos vendem amendoins um bocado por um bilhete um bilhete por um centavo e todos podiam falar todos eram angelicais e sentimentais para com os trabalhadores era tudo tão sincero"
Ou também o bom e velho Jack London, conhecedor de homens e lobos, em "Como me tornei socialista", velho bebedor de vinho ruim entre vagabundos e indigentes de viajantes de vagões:
"Voltando a minha conversão. Acho aparentemente meu individualismo feroz foi extraído de mim e foi-me inculcada outra coisa, de forma eficaz. Mas, assim como eu havia sido um individualista sem saber, era agora um socialista sem saber, ou seja, um socialista não científico (...) Desde aquele dia abri muitos livros, mas nenhum argumento econômico (...) me afeta tão profundamente e tão convincentemente como o dia em que vi pela primeira vez os muros do abismo social se erguerem à minha volta e me senti escorregando para as ruinas que se amontoavam lá no fundo".
Tem uma coisa também: de que passeatas será que ele está falando? Da turma da Daslu, do movimento dos "cansados" na raça da Sé? ou do MST, ou do MTST ou outro movimento social? Bom, é bem diferente a perspectiva de classe. A não ser que o mesmo seja um pós-moderno, que afirme que as grandes narrativas morreram, afirmando o fim das classes, o fim da história, da política. Só se não deu conta do seu próprio fim.
Sei lá se boas intenções é o que se pode dizer que existem em passeatas. Se são boas ou más, penso que estão para além de bem e mal. O que dá para dizer apenas é que são intenções apenas: no caso dos reacionários, de conservar o status quo; o populacho, de arrancar algo, meu chapa: seja salário, seja terra, moradia, seja direitos, ou mesmo menos relógio, como a luta histórica e imediata pela redução da jornada de trabalho, que traz mais tempo livre para os e as trabalhadores lerem, inclusive os seus livros.
Sempre algo material, que repercute no imaterial. E me pergunto: o que não é material? Até poder ter mais tempo para filosofar, ler contos, tomar cachaças, coisas e regalias do espírito, foram necessárias passeatas... são reflexos nas condições materiais de vida, lazer, etc.
E, apesar da aparente unidade, da convicação, tem tanta gente lá dentro, no meio... como saber das intenções, primeiras, ou segundas? é um bordel lá dentro, meu caro, cheio de putas véias e novas da Política... mas que putas não tem interesses ou "intenções", sejam boas ou malvadas?
Voltando ao nosso London, talvez a sua perspectiva se concretize, camarada, quando realizar o ques me lembro do que disse em outro conto O que a vida significa para mim: "Vejo à frente um tempo em que o homem deverá caminhar para alguma coisa mais valiosa e mais elevada que seu estômago."
Para além dos relógios e fábricas, o que infelizmente não está posto ainda de imediato, nem para ti, que vende seus livros para sobreviver, ou o Chinaski o homem pau pra toda obra para poder escrever:
"Lembrei de meus dias em Nova Orleans, vivendo de duas barras de caramelo de cinco centavos por dia, ao longo de várias semanas, para ter tempo livre para escrever. Mas passar fome, infelizmente, não melhora a arte. Apenas a obstrui. A alma de um homem está profundamente enraizada em seu estômago. Um homem pode escrever muito melhor após comer um belo pedaço de filé acompanhado de uma dose de uísque do que depois de uma barra de caramelo de um níquel. O mito do artista faminto é um embuste.", Factótum