Nesta semana que passou, peguei emprestado pra conferir um livro da biblioteca. É que eu estou um bocado limitado, preso a trilhos, sem muita mobilidade, sem poder fazer extravagâncias ou dar pulos e vôos mais altos. Aprendi a viver com bem pouco, apenas o necessário, e vou tocando até devolverem (quase) tudo o que nos roubam.
Enquanto espero o trem, ou na volta sentado, vou mandando ver na leitura. Estou um bocado ferido, lambendo os machucados de cavaleiro andante quixotesco. Já tracei o Anjo Azul da escola nesse lance, um de poemas do Rilke, um Chandler que não consegui engolir por enquanto, e fico distraindo lendo Leminski ou Arnaldo Antunes enquanto espero na aula vaga. Da biblioteca peguei os contos da cantuária, do inglês Chaucer, o criador da obra e dos estilo de contos ingleses no século XIV. Um dos pioneiros, precursor da literatura inglesa.
Eu já conhecia os contos a partir da versão feita para o cinema pelo Pier Paolo Pasolini, o primeiro da trilogia da vida, que conta ainda com as mil e uma noites da arábia, bem como com o Decamerão de Giovvani Boccacio.
Todos os contos revelam um sarcasmo e uma acidez com a qual me identifico demais. O que eu gosto é disso mesmo, do deboche da corte real, do deboche do poder. Os contos dos rapazes que aprontam para o carpinteiro, para traçar a mulher dele, são um exemplo. E o caso dos estudantes que traçam a mulher e a filha do moleiro, são de rachar o bico enquanto se lê. A caricatura, a arte de debochar dos poderosos nobres e do clero, com as pitadas de sexualidade e humor, é a marca destes escritores. A escrita de um Boccacio, a narrativa de Sherazade ou os contos de Chaucer estão para a pintura de um Giotto, o surrealismo orgiástico precoce do Bosch ou de um Brueghel, como os retratou Pasolini em sua visão dionisíaca do sexo.
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