domingo, 12 de julho de 2009

Os yuppies e os operários-padrão (ou seria patrão?) da cultura

"Lembrei de meus dias em Nova Orleans, vivendo de duas barras de caramelo de cinco centavos por dia, ao longo de várias semanas, para ter tempo livre para escrever. MAs passar fome, infelizmente, não melhora a arte. Apenas a obstrui. A alma de um homem está profundamente enraizada em seu estômago. Um homem pode escrever muito melhor após comer um belo pedaço de filé acompanhado de uma dose de uísque do que depois de uma barra de caramelo de um níquel. O mito do artista faminto é um embuste.", Chinaski, Factótum

"Compreendo que ele queria ser simpático, mas não afrouxa, só fala de literatura. Puta merda, que assunto mais chato! Sabe que nunca conheci um escritor que eu tivesse gostado. são uns sujeitos que não valem nada, umas verdadeiras bostas humanas..." Bukowski, Você aconselharia alguém a ser escritor


Não é de hoje que a arte, a cultura e a literatura submeteram-se à mercantilização, À industrialização e ao comércio, ao mercado. Não sou nem um pouco frankfurtiano neste ponto, não compartilho das lamúrias de um Adorno, nem do Platonismo da perda da “aura” de um Benjamin. Pra mim, tem mais é que copiar, reproduzir mesmo, dará mais acesso ao povo a coisas que só a burguesia tem acesso, como óperas, música erudita, filmes etc., que sã caríssimos os ingressos para assistir.
Que tenha vida longa pirataria, e que morra a hipocrisia de corporações Sony, que vendem mídias, computadores, e depois vem com ranço moralista "lutar contra a pirataria".

Não trago nenhum traço ou ranço de purismo com o fato de se ganhar grana com a arte, com a cultura, com a literatura. Muito pelo contrário. Acho mais sincero do que ficar fazendo rodeios e arrumando desculpas ou justificativas para tal ato. Vender poemas é o mesmo que vender amendoins, brigadeiros, ou entregar pães e bolos, ou abrir uma massa de pizza, ou trampar em uma livraria. Tudo isso já fiz. A sociedade capitalista transforma tudo em mercadoria, inclusive o trabalho, que é assalariado e há uma divisão internacional, entre manual e intelectual etc, como examinou corretamente o Marx. Um escritor, um artista ou poeta realizam trabalho intelectual. Mas não deixa de ser trabalho, e ainda, recebe por isso. Inclusive a literatura, o teatro etc "marginais" (mais adaptada ou integrada ao possível do que está hoje, impossível).

O que eu acoh eengraçado é ver os yuppies e operários-padrão culturais. Conheço alguns, há os proletas, os lumpen sem consciência, alguns são até pequenos burgueses, pois são pequenos proprietários de teatros (tenho um amigo que foi empregado de um deles), de um negócio cultural.

Os yuppies culturais são ardilosos, tentam mentir, mas não conseguem enganar-nos com sua produção de ideologia, pois não tem como disfarçar sua dupla ou tripla jornada de trabalho num mesmo dia. Na maioria das vezes, noite, pois são dandis, e até conseguimos ver uma pouco de poesia nisto, ainda que não os faça diferente de nada. Pois até o dandismo mais famoso de um Wilde ou da geração batida ensinou-nos a viver não de acordo com padrões políticos ou apolíticos, comportamentais etc. Mas eles mesmo seguem um padrão já preestabelecido. Às vezes são até quatro jornadas, pois até a farra faz parte da sua jornada.

Ninguém nunca pediu que façam um realismo soviético com a arte. Seria instrumentalizá-la, o que é péssimo, pois tem de ter liberdade na criação. Mas esperamos um pouco menos de mentira, ou ao menos, um pouco menos de ocultamento e mascaramento da realidade nua e crua.

Os yuppies, os operários-padrão da cultura, no entanto, parecem trazer alguma culpa ou má-consciência, uma vez que precisam ficar justificando suas escolhas ou explicar o modo de vida que levam perante o público. Grande tolice. Ao invés do mascaramento (aliás, que faz parte da sua produção teatróloga), seria mais simples apresentarem-se como simples trabalhadores da arte, não se achar mais do que ninguém pelo que faz. Pois nesta e em toda sociedade em que o trabalho é assalariado, há venda de mercadoria e da sua força de trabalho, ainda que sejam suas elucubrações cerebrais, seu dispêndio de cérebro, de suas performances teatrais ou ainda das biritas que bebem para produzir tudo isto. Ou não precisam pagar suas contas e fazer suas compras, como todo mundo precisa?

Se não precisassem, seriam mais dignos e honesto em retirar-se para o meio do mato e apenas recitar poemas e suas peças bucólicas, sem cobrar por isso. Mas não se retiram, e aí que está a grande contradição da parada de se ahcar mais. Chega de idealismo e purismo babacas de ficar fazendo rodeios, poetas, dramaturgos e escritores.

Enfim, um empacotador do supermercado faz a mesma coisa, sem precisar se exibir ou pensar que faz grande bosta, e pode ser um poeta também nas horas vagas: pois é tudo a mesma merda mesmo, tudo é trabalho, e serve para ganhar dinheiro no final das contas.



"- Os escritores são prostitutas - disse Stobbs - os escritores são as prostitutas do universo.
- As prostitutas do universo se dão muito melhor, meu amigo
."

Charles Bukowski, numa fria.

(É incrível, pois escrevi uns versos lá pra trás, podem conferir, que falam "prostituo meus versos...". Isso há uns 12, 11 anos. Nem tinha lido o Buk naquela época. Mas é a coincidência)

"- Muitos caras aqui pensam que são bons no volante. (...) Não sou nenhum pastor, mas vou lhes dizer uma coisa: essa vida que as pessoas levam hoje em dia está deixando todas elas loucas, e dá para ver essa loucura no modo como dirigem. Não estou aqui para dizer a vocês como tocar suas vidas. Vocês tem que perguntar isso pros seus rabinos, padres ou pras putas da esquina. Estou aqui para ensinar vocês a dirigir.
- Puta que pariu - disse um garoto ao meu lado. - O velho Smithson manda ver hein
- Todo homem é um poeta - eu disse
"

Chinaski em Factótum.

12/07/2009

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